Vincent Aboubakar: o camaronês que provocou o Brasil e decidiu na Copa de 2022

O capitão que falou grosso — e entregou em campo
“Não temos medo do Brasil.” Dias antes do encontro no Catar, a frase soou como provocação gratuita. No fim, virou roteiro de Copa. O autor? Vincent Aboubakar, 30 anos, capitão de Camarões, que cravou de cabeça a vitória por 1 a 0 sobre os cinco vezes campeões, no Lusail, e ainda saiu expulso por tirar a camisa na comemoração. Cena forte, jogo histórico, e a confirmação de que ele não fala por falar.
Aboubakar não é o nome mais midiático do elenco – não joga em um gigante europeu como Eric Maxim Choupo-Moting (Bayern), André-Frank Zambo Anguissa (Napoli) ou André Onana (à época no Inter). Mas, na seleção, é a referência. Foi assim na Copa Africana de Nações de 2021, quando terminou como artilheiro com 8 gols, comandando a equipe de Rigobert Song e recuperando o protagonismo que parecia distante após seguidas lesões de joelho na Europa.
Antes do duelo com o Brasil, ele disse à Fifa que a seleção brasileira não lhe causava temor e que, sem um grupo realmente unido, nomes pesados não bastavam. Parecia bravata. Na prática, foi um recado sobre como ele enxerga o jogo: coletivo forte, gente que decide nos detalhes. O detalhe, aliás, foi o dele.
A bola do gol nasceu de um cruzamento preciso pela direita, nos acréscimos. Aboubakar se desmarcou, atacou o espaço e testou no canto. 90+2 no relógio. Estádio lotado, silêncio dos brasileiros, festa camaronense. Ele tirou a camisa, recebeu o segundo amarelo e caminhou para fora com um sorriso incrédulo. Dramático? Muito. Inútil? Nem tanto. Foi a primeira vitória de uma seleção africana sobre o Brasil em Copas do Mundo.
O contexto do jogo importa. O Brasil, já classificado, poupou titulares. Ainda assim, a defesa brasileira vinha sólida na fase de grupos. Camarões precisava vencer e torcer por um tropeço da Suíça contra a Sérvia. Ganhou a parte que dependia de si; a outra não veio. A Suíça venceu, e os Leões Indomáveis ficaram pelo caminho. Mesmo assim, o gol de Aboubakar virou cartão-postal do torneio.
Quem é Vincent Aboubakar
Nascido em Yaoundé, Aboubakar apareceu cedo no Coton Sport, potência local que exporta talentos. Chegou à França ainda jovem, passou por Valenciennes e Lorient, e se consolidou no Porto. Em Portugal, alternou fases ótimas com paradas por lesão, mas sempre mostrou poder físico, leitura de área e uma cabeçada pesada. Mais tarde, brilhou no Besiktas, na Turquia, e no período pré-Copa defendia o Al-Nassr, da Arábia Saudita.
Na seleção, ganhou espaço já como sub-20 e fez parte do grupo campeão da Copa Africana de 2017. Voltou ao centro do palco em 2021, em casa, artilheiro e capitão. Sob o comando de Rigobert Song, ex-zagueiro e ídolo do país, virou o homem de confiança: segura a bola, dá opção para quem vem de trás, decide dentro da área e não se esconde em jogos grandes.
O discurso firme antes do Brasil não foi um ato isolado. Aboubakar costuma falar com franqueza sobre respeito e união no vestiário. Para ele, camisa pesa, mas não resolve sozinha. Em Lusail, transformou a tese em prática: posicionamento correto, frieza na finalização e entrega até o último minuto.
Do outro lado, o Brasil de Tite usou um time alternativo, ainda assim com peças fortes. A partida ficou travada, com Camarões competitivo nos duelos e organizado nas coberturas. Quando o ritmo brasileiro caiu nos minutos finais, os africanos encontraram a brecha. A assistência veio do banco, o cabeceio certeiro saiu do capitão, e a foto do jogo ficou eternizada: Aboubakar comemorando, cartão vermelho na sequência e aplausos até de adversários.
O resultado não alterou o destino do grupo G no topo — o Brasil avançou em primeiro. Para Camarões, foi um alívio e um orgulho. Não valeu vaga, mas valeu memória. Em Copas, cada seleção carrega seus momentos. Para os Leões Indomáveis, 2 de dezembro de 2022 entrou para a lista ao lado de feitos como a campanha de 1990.
O impacto para Aboubakar foi imediato. O mundo inteiro viu seu nome nos trend topics, redes sociais foram inundadas de vídeos do gol e, no vestiário, a sensação era de missão cumprida. Ele já tinha o currículo para sustentar a braçadeira; ganhou também o símbolo perfeito de sua liderança: falar alto, assumir o risco e responder com bola na rede.
Se você olhar a carreira dele, a linha é clara: jogador de jogos grandes. Em finais continentais, clássicos na Turquia, mata-mata pela seleção. Não é o atacante mais veloz nem o mais técnico da geração africana, mas é direto, competitivo e letal na pequena área. O tipo de camisa 9 que todo treinador adora quando o jogo aperta.
No balanço da Copa do Mundo do Catar, Camarões saiu sem a vaga, mas com um triunfo raro e um protagonista evidente. Para muitos, aquele gol contra o Brasil foi o mais importante da vida de Aboubakar. Para ele, foi só a prova de que coragem e convicção, quando andam com trabalho, podem reescrever uma noite no maior palco do futebol.
Escreva um comentário